e margens lisas ou recortadas,
e capas (isto é copas) e capítulos
de flores e letras de oiro nas lombadas.
E são histórias de reis, histórias de fadas,
as mais fantásticas aventuras,
que se podem ler nas suas páginas
no pecíolo, no limbo, nas nervuras.
As florestas são imensas bibliotecas,
e até há florestas especializadas,
com faias, bétulas e um letreiro
a dizer: «Floresta das zonas temperadas».
É evidente que não podes plantar
no teu quarto, plátanos ou azinheiras.
Para começar a construir uma biblioteca,
basta um vaso de sardinheiras.
Jorge Sousa Braga, Herbário (2002)
A todos os pais um feliz dia!
Os filhos são figuras estremecidas
e, quando dormem, a felicidade
cerra-lhes as pálpebras, toca-lhes
os lábios, ama-os sobre as camas.
É por mim que chamam quando temem
o eclipse e o temporal. Trazem nos cabelos
o aroma do leite e da festa das rosas.
Voam-me por entre os dedos, por entre
as malhas da rede de espuma
que lanço a seus pés. Reinam
num sítio de penumbra onde não
me atrevo sequer a dizer quem sou.
José Jorge Letria, in "Os Achados da Noite"
Quem disse que Matemática não rima com poesia?
A História Infinita do p
"Julgando o fim a chegar,
O Pi deu de começar
A preocupar-se consigo.
E um dia fez a bagagem
E partiu numa viagem
Ao fundo do seu umbigo.
Mas o umbigo era mais fundo
Do que o umbigo do mundo
E o Pi regressou mais
Baralhado que à partida,
De cabeça confundida
Com cálculos decimais...
Hoje o Pi, já muito velho,
Senta os netos nos joelhos
E fala-lhes de Alexandria,
Da China, de Chung Zhi,
De Al-Kashi, de Al-Kwarismi,
Da Casa da Sabedoria.
E dos milhares de milhão
De casas onde viveu
Na sua aventurosa existência,
Desde o dia em que nasceu
Da estranha relação
dum diâmetro e uma circunferência."
Manuel António Pina em “O Pequeno Livro de Desmatemática”
Vem à Biblioteca visitar uma curiosa exposição sobre o Pip .
Passatempo:
Diz-nos porque se comemora o dia mundial do Pi a 14 de março. Coloca a tua explicação aqui nos comentários.
Se acertaste na explicação, a biblioteca tem uma surpresa para ti.
PARTICIPA!
Segue o teu destino,
Rega as tuas plantas,
Ama as tuas rosas.
O resto é a sombra
De árvores alheias.
A realidade
Sempre é mais ou menos
Do que nós queremos.
Só nós somos sempre
Iguais a nós próprios.
Suave é viver só.
Grande e nobre é sempre
Viver simplesmente.
Deixa a dor nas aras
Como ex-voto aos deuses.
Vê de longe a vida.
Nunca a interrogues.
Ela nada pode
Dizer-te. A resposta
Está além dos deuses.
Mas serenamente
Imita o Olimpo
No teu coração.
Os deuses são deuses
Porque não se pensam.
Ricardo Reis - Heterónimo de Fernando Pessoa, in "Odes"
Sinopse
Há espaços que são sempre nossos. E quem os habita, habita também em nós. Falamos da nossa rua, desse lugar que nos acompanha pela vida. A rua como espaço de descoberta, alegria, tristeza e amizade. Os da Minha Rua tem nas suas páginas tudo isso.
"Como num filme, sempre me acontecia isso: eu olhava as coisas e imaginava uma música triste; depois quase conseguia ver os espaços vazios encherem-se de pessoas que fizeram parte da minha infância. De repente um jogo de futebol podia iniciar ali, a bola e tudo em câmara lenta, um dia eu vou a um médico porque eu devo ter esse problema de sempre imaginar as coisas em câmara lenta e ter vergonha de me dar uma vontade de lágrimas ali ao pé dos meus amigos.
A escola enchia-se de crianças e até de professores, pessoas que tinham sido da minha segunda classe, da terceira...
Quando alguém me tocava no ombro, as imagens todas desapareciam, o mundo ganhava cores reais, sons fortes e a poeira também."
O Autor
Ondjaki nasceu em Luanda em 1977. Prosador. Às vezes poeta. Licenciou-se em Sociologia e é membro da União dos Escritores Angolanos.
Interessa-se pela interpretação teatral e pela pintura (duas exposições individuais, em Angola e no Brasil). Já em Lisboa, fez teatro amador durante dois anos e um curso profissional de interpretação teatral. No ano 2000 recebeu uma menção honrosa no prémio António Jacinto (Angola) pelo livro de poesia Acto Sanguíneo. Participou em antologias internacionais (Brasil e Uruguai) e também numa antologia portuguesa. Co-realizou um documentário sobre a cidade de Luanda (Oxalá Cresçam Pitangas – Histórias de Luanda).
Em 2013, com Os Transparentes, ganhou o Prémio José Saramago.